FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. 1. ed. Rio de Janeiro: J.E.M.M. Editores Ltda, 1975. 1500 p.
Segunda-feira, 18:50 h. O terror tomou conta do trabalhador, pai de família, que chegou em casa, do trabalho, e foi recebido pela mulher que o cumprimentou com uma frase semelhante a esta:
- “Meu amor, a TV não quer ligar!”
Era um tempo em que predominavam os aparelhos de TV em preto & branco. A moeda da vez era o cruzeiro novo.
Após infrutíferas tentativas do marido, herói da casa, mas insipiente na arte da eletrônica [a não ser que uns tapas no aparelho resolvessem, sabe-se lá por quê], ele finalmente entregou os pontos:
- “Amanhã vou chamar o técnico. Hoje tu vais ter que ficar sem [ver] a novela das 8.”
Na manhã do dia seguinte o técnico de TV, que tinha uma oficina a uma quadra e meia de distância, foi chamado por dona Veridiana que lhe explicou o problema.
O técnico tentou ligar a TV... e nada. Olhou para o cabo de força e o desligou da tomada.
- “Vou ter que levar o aparelho para dar uma olhada”- disse ele à dona Veridiana, que imediatamente concordou, agradecendo-lhe pelo pronto atendimento.
Vivomar, técnico de televisão & rádio, com boa experiência, era muito requisitado não só por clientes das redondezas, mas também por pessoas de locais mais afastados que, em função das boas referências que recebiam de terceiros, também recorriam aos serviços desse profissional.
Já na oficina, colocou a TV na bancada, abriu a tampa traseira, com as precauções necessárias quando se trabalha com um equipamento de alta tensão, e constatou o defeito.
Ao final do expediente, com o sol já se debruçando no horizonte encoxilhado da pequena cidade [distante não mais do que 115 Km da capital], voltou à casa de dona Veridiana. Falou com o seu Alaor e deu o veredictum:
- “O problema é no fly-back. Tem que trocar, mas eu não tenho aí. Vai ter que vir de Porto Alegre.”
O tal de fly-back era a peça mais cara da TV.
- “E quanto custa para mandar trazer?”- perguntou o cliente, desanimado.
- “Mais ou menos uns cento e quarenta e seis pila, mais o preço da viagem, seu Alaor!”
- “Tanto assim?”
- “Mas eu acho que amanhã o meu sobrinho vai lá consultar p’ros olhos, e eu posso pedir p’ra ele trazer. Aí não cobro a viagem, só a mão-de-obra. No mais tardar, sexta-feira, lhe entrego o aparelho, funcionando como fosse novo”.
- “É..., então está certo, seu Vivomar!”
Manhã de sexta-feira. Vivomar, o técnico, vai começar a trabalhar para eliminar o único problema que encontrou na TV do seu Alaor. Sai de casa e se dirige até a ferragem mais próxima para comprar um cabo de energia [que custa NCr$ 4,00] e troca o cabo velho pelo novo.
A TV do seu Alaor volta a funcionar normalmente.
No final da tarde chama Jorge, o carroceiro, para mandar a TV de volta ao cliente. Paga NCr$ 7,00 pelo frete e recomenda:
- “Leva esta TV ali no seu Alaor. Diz que daqui a pouco eu passo lá para testar.”
Quase junto com a encomenda, chega e vai se enfiando na casa do Alaor. A TV já está na estante. Ele conecta o cabo de energia do aparelho à tomada, gira o botão “liga”, e imagem & som perfeitos são captados de imediato.
E falou meio-cabisbaixo:
- “Dona Veridiana, tive que trocar também o fio que liga na tomada, mas isto eu não vou lhe cobrar, é por minha conta.”
- “E quanto é deu, no total, seu Vivomar?”- perguntou ela.
O técnico apresentou este orçamento:
Segunda-feira, 18:50 h. O terror tomou conta do trabalhador, pai de família, que chegou em casa, do trabalho, e foi recebido pela mulher que o cumprimentou com uma frase semelhante a esta:
- “Meu amor, a TV não quer ligar!”
Era um tempo em que predominavam os aparelhos de TV em preto & branco. A moeda da vez era o cruzeiro novo.
Após infrutíferas tentativas do marido, herói da casa, mas insipiente na arte da eletrônica [a não ser que uns tapas no aparelho resolvessem, sabe-se lá por quê], ele finalmente entregou os pontos:
- “Amanhã vou chamar o técnico. Hoje tu vais ter que ficar sem [ver] a novela das 8.”
Na manhã do dia seguinte o técnico de TV, que tinha uma oficina a uma quadra e meia de distância, foi chamado por dona Veridiana que lhe explicou o problema.
O técnico tentou ligar a TV... e nada. Olhou para o cabo de força e o desligou da tomada.
- “Vou ter que levar o aparelho para dar uma olhada”- disse ele à dona Veridiana, que imediatamente concordou, agradecendo-lhe pelo pronto atendimento.
Vivomar, técnico de televisão & rádio, com boa experiência, era muito requisitado não só por clientes das redondezas, mas também por pessoas de locais mais afastados que, em função das boas referências que recebiam de terceiros, também recorriam aos serviços desse profissional.
Já na oficina, colocou a TV na bancada, abriu a tampa traseira, com as precauções necessárias quando se trabalha com um equipamento de alta tensão, e constatou o defeito.
Ao final do expediente, com o sol já se debruçando no horizonte encoxilhado da pequena cidade [distante não mais do que 115 Km da capital], voltou à casa de dona Veridiana. Falou com o seu Alaor e deu o veredictum:
- “O problema é no fly-back. Tem que trocar, mas eu não tenho aí. Vai ter que vir de Porto Alegre.”
O tal de fly-back era a peça mais cara da TV.
- “E quanto custa para mandar trazer?”- perguntou o cliente, desanimado.
- “Mais ou menos uns cento e quarenta e seis pila, mais o preço da viagem, seu Alaor!”
- “Tanto assim?”
- “Mas eu acho que amanhã o meu sobrinho vai lá consultar p’ros olhos, e eu posso pedir p’ra ele trazer. Aí não cobro a viagem, só a mão-de-obra. No mais tardar, sexta-feira, lhe entrego o aparelho, funcionando como fosse novo”.
- “É..., então está certo, seu Vivomar!”
Manhã de sexta-feira. Vivomar, o técnico, vai começar a trabalhar para eliminar o único problema que encontrou na TV do seu Alaor. Sai de casa e se dirige até a ferragem mais próxima para comprar um cabo de energia [que custa NCr$ 4,00] e troca o cabo velho pelo novo.
A TV do seu Alaor volta a funcionar normalmente.
No final da tarde chama Jorge, o carroceiro, para mandar a TV de volta ao cliente. Paga NCr$ 7,00 pelo frete e recomenda:
- “Leva esta TV ali no seu Alaor. Diz que daqui a pouco eu passo lá para testar.”
Quase junto com a encomenda, chega e vai se enfiando na casa do Alaor. A TV já está na estante. Ele conecta o cabo de energia do aparelho à tomada, gira o botão “liga”, e imagem & som perfeitos são captados de imediato.
E falou meio-cabisbaixo:
- “Dona Veridiana, tive que trocar também o fio que liga na tomada, mas isto eu não vou lhe cobrar, é por minha conta.”
- “E quanto é deu, no total, seu Vivomar?”- perguntou ela.
O técnico apresentou este orçamento:
visita | grátis |
cabo energia | grátis |
flyback | 146, |
carroceiro- ida e volta | 14, |
mão-de-obra | 29, |
total | 189, |
Então me dei conta que o lucro do técnico, tirando a despesa com o carroceiro (R$ 14,00) e o valor do cabo de energia que ele comprou (R$ 4,00), deu R$ 171,00. Coincidência, ou não, o número sugere uma referência ao Artigo 171 do Código Penal. E não é preciso comentar mais nada.
Na semana seguinte, Vivomar atende outra cliente em sua oficina:
- “Já dei uma olhada no seu televisor, dona Margarida!
- “Já dei uma olhada no seu televisor, dona Margarida!
O defeito é no fly-back."
Nota do autor
Semelhanças quanto a nomes de pessoas envolvidas nesta estória podem ser mera coincidência.
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