sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

CUBA E A CRISE DOS MÍSSEIS

Nação mais segura do que os Estados Unidos da América (183.691.000 habitantes) não havia, uma vez que seu poder econômico e bélico era capaz de intimidar qualquer possível agressor. Além disto, dois oceanos, a leste e a oeste, os separavam do resto do mundo; e seus vizinhos, México, ao sul, e Canadá, ao norte, eram países com quem mantinham boas relações.

Cuba (7.115.263 habitantes), a sudeste, uma ilha com aproximados 110 mil quilômetros quadrados, cerca de 80 vezes menor, destacava-se somente como um país que produzia açúcar, mas isto e sua proximidade pouco importavam aos americanos.

A partir de 1898, quando se libertou do domínio espanhol e após um período de transição de quase quatro anos nos quais foi governada por uma junta militar, a República de Cuba passou a sofrer a influência e intervenção direta dos Estados Unidos que a tinha ajudado na Guerra da Independência Cubana, exigindo, em contrapartida, uma compensação que viria a interferir diretamente no futuro político da ilha.

Cuba virou um resignado protetorado americano até 1933, quando Ramón San Martín, médico e líder político cubano, passou a empenhar-se para apagar todos os vestígios da colonização espanhola e também para livrar Cuba das pretensões hegemônicas dos Estados Unidos.
Apoiado pela Rebelião dos Sargentos, encabeçada pelo sargento Fulgencio Batista, ele depôs o general Gerardo Machado que estava no poder desde 1925, mas que se viu desgastado diante dos efeitos da crise norte-americana de 1929, e assumiu a presidência provisória.

É racional afirmar que San Martín foi o precursor da Revolução Cubana de 1956/1959 que estabeleceu para Cuba uma diretriz política que permanece até os dias de hoje. Foi ele quem, contrariando diversos interesses de políticos comprometidos com as elites que serviam ao capitalismo americano: ignorou a chamada Emenda Platt, de 1902, que permitia aos Estados Unidos intervir em Cuba sempre que os seus (dos EE.UU.) interesses estivessem ameaçados; nacionalizou o comércio que até então estava nas mãos dos espanhóis; criou os direitos trabalhistas e a autonomia universitária; concedeu o direito de voto à mulher

Em janeiro de 1934, Fulgencio Batista convocou e presidiu a chamada Junta Militar de Columbia, onde propôs destituir o presidente Ramón San Martín que, dias depois, apresentou sua demissão, foi exilado para o México e substituído por Carlos Mendieta y Montefur, cujo feito mais importante foi livrar Cuba, definitivamente, da Emenda Platt

Ainda que o mandato de Mendieta tenha sido reconhecido pelos EE.UU., quem, na verdade, dirigia o país era Fulgencio Batista, orientado pelo embaixador americano Jefferson Caffery. Mas, atormentado por constantes ataques políticos que sofria por parte da oposição, Carlos Mendieta resolveu renunciar em 11 de dezembro de 1935, em favor do seu secretário de estado José Agripino Barnet y Vinarejas, o qual tratou de, imediatamente, convocar eleições diretas para presidente para o ano seguinte.

Elegeu-se então presidente de Cuba [pelo voto popular] Miguel Mariano Gómez y Arias que começou seu governo com a tomada de uma série de medidas de caráter econômico, social, cultural e político. Mas como nada parecia ser satisfatório para os cubanos, os políticos de oposição e a opinião pública não lhe deram trégua em críticas, apesar do apoio que conseguiu temporariamente obter do Congresso. Depois, acusado de interferir no poder legislativo, não suportou as pressões políticas e renunciou na véspera do natal de 1936. Na verdade, o agora coronel Fulgencio Batista estava por trás do golpe que conseguiu derrubar o presidente. O motivo aparente foi o veto de Arias à criação de escolas rurais sob o controle do exército.

Assumiu então o poder Federico Laredo Brú, um vice-presidente mais solidário ás pretensões de Fulgencio Batista.
Brú concedeu anistia ao ex-ditador Gerardo Machado e implantou medidas de bem-estar social (leis de criação de pensões, seguros, salários mínimos e horários de trabalho limitados).
Brú encaminhou, em 1937, a aprovação da Lei de Coordenação do Açúcar, que estabeleceu um novo sistema permanente de divisão dos lucros entre os trabalhadores, os produtores de cana e os donos das usinas de açúcar. Através dessa lei uma escala móvel se deslocava de acordo com o preço do açúcar, garantindo a redistribuição da renda entre as classes sociais, ao mesmo tempo em que oferecia uma proteção nacionalista às usinas e aos produtores de cana cubanos. Os cubanos passaram a deter, em seguida, 70% da indústria açucareira, em comparação com os cerca de 30% em 1925.
O presidente Brú também emitiu um decreto que declarou que todas as empresas deveriam ser lideradas por cidadãos cubanos. 1939.

No controle extra-oficial dos destinos políticos de Cuba, Fulgencio Batista convocou eleições e ganhou a presidência em meio a denúncias de fraudes, sumiço de urnas e outras ilegalidades, obtendo, por conta disto, 45,68% dos votos. Governou Cuba entre 10 de outubro de 1940 e 1º de junho de 1944, e durante esse tempo, mediante corrupção e investimentos diversos, Batista acumulou bens de tal forma que se tornou o homem mais poderoso do país.

Em 1944, Ramón Grau San Martín, que já havia governado Cuba por 4 meses – de 10 de setembro de 1933 a 14 de janeiro de 1934 – obteve 45% dos votos em novas eleições – desta vez sem fraudes – e tirou o governo das mãos de Fulgencio Batista. Em um período marcado por denúncias e corrupção, governou Cuba de 10 de outubro de 1944 a 10 de outubro de 1948, substituído pelo presidente eleito para o novo período, Carlos Prío Socarrás que 7 meses antes de completar seu mandato foi deposto por Fulgencio Batista – de novo ele – após um golpe de estado. Instalou-se aí uma ditadura escancarada que durou quase 7 anos - de 05 de abril de 1952 a...
  
Na foto: 
Raúl Castro, Fidel Castro e outro guerrilheiro em um acampamento das forças revolucionárias.

Comandados por Fidel Castro Ruz, Ernesto [Che] Guevara, Camilo Cienfuegos e Raúl Castro Ruz - 4 combatentes de um grupo de 12 remanescentes da fracassada campanha de 1956, na qual Fidel e outros 81 homens tentaram, à força, destituir o governo de Batista – os guerrilheiros, apoiados pela população rural e urbana, partiram em direção à Havana, onde tomaram o poder em 8 de janeiro.

Enquanto Fulgencio Batista fugia para os EE.UU., Fidel Castro foi nomeado Comandante em Chefe de todas as forças armadas, terrestres, aéreas e marítimas e, em seguida, Primeiro Ministro.
Urrutia Lleó assumiu provisoriamente a presidência de Cuba - 03 de janeiro a 17 de julho de 1959 – mas renunciou devido à pressão popular em favor de Fidel Castro que já tinha anunciado sua saída do cargo de Primeiro Ministro por causa do próprio Lleó que não aceitava as leis e reformas socialistas empreendidas pela revolução.

Urrutia LLeó foi substituído na presidência por Osvaldo Dorticós Torrado que permaneceu no cargo até 1976, quando foi substituído pelo próprio Fidel Castro. O novo governo de Cuba interveio nas grandes propriedades, promovendo a reforma agrária, nacionalizando empresas e bancos estrangeiros, reestruturando a saúde pública e fazendo uma reforma no ensino.

Algumas dessas medidas não foram aceitas pelo governo dos Estados Unidos que [em janeiro de 1961] rompeu relações com o governo de Cuba. Três meses depois, um grupo de exilados cubanos, treinados pela Central Intelligence Agency (CIA) dos Estados Unidos, tentou invadir a ilha. O episódio ficou conhecido em Cuba como La Batalla de Girón; no Brasil,

A Invasão da Baía dos Porcos. Um relatório divulgado pelo Arquivo Nacional de Segurança dos EE.UU., em fevereiro de 1998, dá conta que a invasão começou a ser planejada em agosto de 1959 por ordem do então presidente Dwight Eisenhower, e tinha como objetivo infiltrar exilados cubanos em seu país de origem com a missão de organizarem uma dissidência contra o regime de Fidel Castro Cerca de 1.400 homens, armados pelos norte-americanos e treinados no Panamá e na Guatemala, formaram o Exército Cubano de Libertação e invadiram os pântanos da Playa Girón em 17 de abril de 1961, imediatamente após a chuva de panfletos e bombas jogados pelos aviões dos EE.UU., os quais ostentavam a estrela da força aérea de Cuba pintada em sua fuselagem para simular uma rebelião interna das forças cubanas.
Os invasores foram derrotados [em apenas 3 dias] pela população cubana organizada em milícias. E para tentar se proteger de futuras invasões desse tipo, em dezembro de 1961 o governo de Cuba anunciou sua opção pelo socialismo, aliando-se à União Soviética.
Instalações militares soviéticas em Cuba
Foto: avião-espião do tipo U-2 - EE.UU.

Julho de 1962. Um súbito aumento no número de navios soviéticos próximos à ilha de Cuba não passou despercebido da inteligência norte-americana, e essa movimentação começou a ser seguida de perto. A desconfiança por parte dos informantes norte-americanos de que os soviéticos estavam prestes a instalar bases militares em Cuba foi ignorada pelo próprio presidente dos EE.UU. John Kennedy preferiu acreditar na palavra do líder soviético Nikita Kruschev que afirmou que a URSS não colocaria armas em Cuba. Em outubro do mesmo ano um avião-espião dos EE.UU. detectou em território cubano o que parecia ser uma base militar em construção. Um estudo mais detalhado nas imagens obtidas concluiu que ali havia 40 silos para abrigar mísseis capazes de carregar ogivas nucleares. Estava desfeita a dúvida da população cubana [que já desconfiava do fato] e dos estadunidenses, incluindo aí o presidente Kennedy que deu a mão à palmatória, uma vez que não acreditou no diretor da CIA, John McCone, quando este lhe informou que os navios soviéticos transportavam cargas bélicas. Esse foi o início do episódio que ficou conhecido mais tarde como A Crise dos Mísseis.

No decorrer da crise, Kennedy se trancou com um grupo seleto de auxiliares (comandados pelo irmão, Robert), apostou numa estratégia moderada e consistente, evitou alarmar a população e, principalmente, não deu ouvidos às pressões dos "falcões" de Washington – sedentos por sangue, os parlamentares republicanos, de oposição, não aceitavam nada aquém de uma ofensiva militar imediata contra Cuba. revista Veja - outubro de 1962. 

Parecia um jogo de xadrez. Kennedy preferiu, no início não efetuar movimentos bruscos, preferindo dar a Kruschev a oportunidade de voltar atrás em quaisquer decisões que estivesse prestes a tomar. Em uma carta [de próprio punho] dirigida a Washington, Kruschev fez a seguinte proposta: Os mísseis soviéticos seriam retirados se Kennedy prometesse não mais voltar a atacar Cuba. Em outra mensagem divulgada publicamente no dia seguinte, Kruschev exigiu a remoção dos mísseis norte-americanos baseados na Turquia, vizinha da URSS. Kennedy preferiu ignorar estas exigências e tratou de responder positivamente [somente] à primeira mensagem de Kruschev. Aguardar a resposta de Nikíta Syerguêievitch Khruchtchof (nome aqui transliterado do alfabeto cirílico) era tudo o que restava aos EE.UU.

Se houve um dia em que a pior das guerras esteve mesmo perto de começar, esse dia foi sábado, 27 de outubro de 1962. Pela manhã, a crise provocou sua primeira e única baixa: o major Rudolph Anderson, que pilotava um U-2 de reconhecimento americano derrubado por baterias antiaéreas soviéticas. Dias antes, Kennedy prometera dar sinal verde para um ataque caso os inimigos dessem o primeiro tiro. Mais consciente dos possíveis desdobramentos dessa ordem, decidiu aguardar. Ao mesmo tempo, os preparativos militares chegavam ao grau máximo. Os dois lados estavam prontos para a batalha. - revista Veja - outubro de 1962.

27 de outubro. Kruschev anunciou, em pronunciamento transmitido pela Rádio Moscou, que a URSS retiraria seus mísseis de Cuba. Aliviada a tensão, os EE.UU., sem divulgações públicas, aceitaram retirar seus foguetes da Turquia, os quais, de qualquer forma, já estavam prestes a serem substituídos. A partir desse incidente, mesmo sem a presença dos mísseis em território cubano, sentiu-se o astuto Fidel Castro protegido de possíveis - mas naquele momento improváveis - ataques norte-americanos. Contava agora Cuba com um poderoso aliado militar, embora o embargo econômico que lhe foi imposto pelos EE.UU. – o qual, ao invés de ceder com o passar dos anos, se acirra ainda mais - tenha travado por completo o seu desenvolvimento econômico. Observemos que com a desintegração da União Soviética em 1991, a economia de Cuba sofreu um retrocesso ainda maior. Com problemas de saúde, Fidel Alejandro Castro Ruz afastou-se temporariamente do governo. Em fevereiro de 2008, renunciou em favor de seu irmão [mais novo] Raúl Castro Ruz. Acreditam alguns teóricos que, aos poucos, Raúl Castro possa introduzir medidas que possibilitem a Cuba sair do isolamento, seguindo princípios econômicos semelhantes aos adotados pela China, com uma abertura gradual, porém controlada do seu mercado externo. Penso, todavia, que isto só vai ocorrer quando os irmãos Castro não mais estiverem no poder.

Bibliografia e outras fontes:
Piletti, N., Piletti, C., Tremonte, T. História e Vida Integrada. P. 137, 138, 139.
Revista Veja – outubro, 1962.
http://rede.outraspalavras.net/pontodecultura/2012/10/18/chomsky-ha-50-anos-o-mundo-esteve-para-acabar/ - Chomsky: por que “o mundo esteve para acabar”, há 50 anos – por Antonio Martins.
http://www.brasilescola.com/biografia/ramon-grau.htm - Brasil-Escola.
http://educaterra.terra.com.br/voltaire/seculo/2003/07/25/001.htm.
http://www.elmundo.es/larevista/num71/textos/cheb.htmlhttp://www.exilio.com/presiden.html.
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-77042012000200005&script=sci_arttext.

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